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Entrevista com Luca Moreira

PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE AUTISMO


Entrevista com Luca Moreira, jornalista com um blog focado em produção de entrevistas sobre cultura, música, arte, literatura e comportamento: https://lucamoreira.com.br/


1. Desafios Cotidianos: No livro "Além do Autismo", você menciona a busca por equilíbrio para os pais de crianças com autismo. Quais são os desafios mais comuns que os pais enfrentam no dia a dia?


Existem os desafios da aceitação primeiramente, aceitar que o filho necessita de um olhar específico. Muitos demoram para passar da fase da negação para a aceitação, pois as pessoas fazem comentários os quais é difícil aceitar que o filho precisa de cuidados especiais, como por exemplo: "A criança está no tempo dela, você está exagerando!" ou "Ele não parece autista!" entre outros.

Por isso, procurar ajuda de especialistas para identificar o que se apresenta é fundamental e, se for comprovado, ter um laudo.

Também há os desafios cotidianos, aqueles que os pais não sabem como lidar, o que fazer mediante situações corriqueiras, até onde o filho está testando os limites ou se ele de fato está precisando de ajuda.

Na maioria das situações, os pais são o ponto chave entre a criança e os terapeutas, e assim, são cobrados de muitos detalhes. Há de ter muita atenção no trato com elas e isso exige muita paciência e tolerância dos adultos envolvidos.


2. Apoio Emocional: O apoio emocional é um dos pilares do seu trabalho. Quais são algumas das técnicas ou práticas que você recomenda para ajudar os cuidadores a lidar com o estresse e as emoções associadas ao autismo infantil?


Muitas vezes a ansiedade, os medos de como serão as coisas, assombram a vida de muitos pais, mães e cuidadores de crianças no TEA. A busca por ter o controle da situação é contínua. Porém, a vida nos ensina que não temos o controle de nada. Muito pelo contrário, quando ficamos ansiosos o estresse vem à tona e isso só prejudica a vida. Por isso, ter um olhar como observador da situação, não julgar, saber ouvir e interpretar, acreditar no potencial que existe em cada um, ter adaptabilidade, resiliência, buscar se aperfeiçoar e ser sua melhor versão, vivendo o agora, ajuda a lidar com desafios únicos que o TEA pode apresentar. Se automotivar praticando o que traz bem estar. Acreditar, focar e persistir é essencial. E acima de tudo, olhar a vida como uma dádiva.


3. Dicas Práticas: Que tipo de dicas práticas para manter a calma e o equilíbrio você aborda no seu livro? Há alguma estratégia que tenha sido particularmente eficaz para você e sua família?


Acredito que além da organização, planejamento e estabelecer prioridades, dicas que trago no livro, as técnicas de respiração são fundamentais para mim. Através delas eu consigo expelir o que incomoda e manter-me equilibrada. Ensinei isso às minhas filhas, para que quando a ansiedade e irritabilidade estiverem presentes, usem as técnicas de respiração, as quais cito no livro. Também acredito que aquietar a mente seja uma forma muito eficaz para sair da agitação mental que nos vemos com frequência. E também, a prática de uma atividade que envolva bem estar ajuda significativamente a manter uma vida mais leve. Eu pratico dança circular, que traz muitos benefícios, sobretudo, me deixando equilibrada para lidar com as diversas situações que se apresentam diariamente.


4. Tempo para o Autocuidado: Segundo o estudo "Retratos do Autismo no Brasil em 2023", 68% dos cuidadores relataram dificuldades de encontrar tempo para descanso e autocuidado. Como seu livro aborda essa questão e o que você sugere para equilibrar as necessidades do cuidador com as da criança?


Cultivar o amor próprio, olhar para si, para a pessoa que existe sem a figura de ser mãe/pai é fundamental para manter o equilíbrio nas relações. Reservar um tempo para ter autocuidado é primordial, pois quando estamos bem, passamos a tranquilidade para os pequenos. Como eu digo no livro Além do Autismo: "Não subestime seu filho, pois ele o vê através de você. Pode ser que ele não expresse isso, que não demonstre, mas, em muitos casos, ele o decifra melhor do que você mesmo."

Então, autoconsciência, analisar como observador as situações, estabelecer limites, saber dizer NÃO e focar nas soluções e não em problemas ajuda a equilibrar a relação.


5. O Método IAP: Você criou o método IAP — Identificar, Atuar e Praticar. Pode nos explicar como ele funciona e como os cuidadores podem aplicá-lo no contexto do autismo infantil?


O método se baseia na necessidade de identificar o que precisa ser tratado, para atuar da maneira adequada e colocar em prática as soluções. Assim, primeiramente, ter um laudo identificando qual nível de suporte a criança está, e com isso, providenciar as terapias e cuidados que ela necessita. Praticar o cuidado e o amor em todas as situações, sejam boas ou ruins, é fundamental. A criança, seja verbal ou não verbal, precisa ser ouvida, compreendida. Não ignore-a! Valorizar cada conquista, celebrar as vitórias, são práticas importantes para conseguir extrair o melhor dela. Lembrando que a criança autista tem várias maneiras de se manifestar, estar aberto para se moldar às suas necessidades e manter este cuidado é fundamental.


6. Planejamento e Organização: Como as famílias podem se organizar para lidar com o autismo, sem sacrificar o bem-estar emocional? Quais são as principais recomendações para manter uma rotina equilibrada?

Criar uma rotina organizada é fundamental para ter uma vida leve e saudável, na minha opinião. O processo pode ser desafiador, mas com disciplina é possível se planejar para que as tarefas e as questões operacionais do dia a dia estejam alinhadas, como por exemplo o levar e buscar, as refeições, as atividades, etc. No meu caso, a minha filha gosta de desenhar a rotina dela para ela seguir, desde quando acorda, como um passo a passo mesmo, bem detalhada e isso a ajuda na realização das tarefas pequenas, para ela não se perder no tempo, algo que acontece com frequência.

Então, detalhar as tarefas, dispor de um lugar calmo para fazer atividades, se programar com tempo extra para caso aconteça algum incidente e a criança não se sinta pressionada, contribui bastante com a organização da rotina. Sempre que possível, delegar tarefas e utilizar ferramentas de organização, como planners por exemplo, podem ajudar bastante também.


7. Entendimento do Comportamento Infantil: Muitas vezes, os pais têm dúvidas sobre como interpretar e lidar com comportamentos desafiadores. Que conselhos você daria para entender melhor as necessidades das crianças com TEA (Transtorno do Espectro Autista)?


A criança com TEA precisa ser ouvida e compreendida. Elas veem o mundo de uma forma única e várias possibilidades passam na mente delas. Conectar-se, identificar o que as motiva e procurar sempre atuar de uma forma diferente quando algo não está dando certo. Ao repetir ações que os desagradam, eles podem ser intolerantes e agressivos. Ter discernimento e fazer de forma diferente para obter um resultado diferente ajuda a identificar o que e como fazer para extrair a melhor versão deles. É como eu cito no livro "Ler nossos filhos requer paciência, tolerância, prática e constância". Criar pessoas seguras do que são e confiantes no que querem traz a recompensa para os pais.


8. Vivência Pessoal e Profissional: Você tem uma carreira em Administração de Empresas e Finanças, e também uma vivência pessoal como mãe de criança atípica. Como essas duas experiências se combinam para inspirar o conteúdo do seu livro?


Durante muito tempo não soube como lidar com as questões da minha filha. Eu me sentia sozinha e desamparada. Então, após muitas tentativas de como fazer, resolvi aplicar soluções de administração para organizar a rotina familiar. E deu certo. Implantei em casa planejamentos semanais, elencando prioridades e revisando as estratégias de tempos em tempos. Isso nos ajudou a ter uma vida mais leve. Alocar bem o nosso tempo, contemplando as necessidades pessoais, profissionais e familiares traz alívio, segurança e previsibilidade. Claro que imprevistos acontecem, mas estar bem e confiante nos torna mais tolerantes e ajudam a ser mais adaptáveis. São estas ferramentas e estratégias que apresento no livro.


9. Equilíbrio Familiar: Como pais e cuidadores podem manter o equilíbrio dentro do ambiente familiar, garantindo que todos recebam a atenção e o cuidado que precisam? Que estratégias você sugere para manter um ambiente harmonioso?


Ter uma comunicação fluida, enaltecer as habilidades e competências de cada um, celebrar as conquistas por mais simples que sejam e ter o hábito de elogiar um ao outro contribui significativamente para manter a harmonia na relação familiar. A dedicação dos responsáveis pela criança deve ser equilibrada, para que não sobrecarregue somente uma das partes. Cultivar o relacionamento amoroso, reservando tempo a dois, não viver somente em função do filho ou do trabalho, e se permitir ser feliz, contribuirá para o bem estar da família em geral. Saber ouvir o outro, praticar a gratidão e realçar as coisas boas da vida permite ter bons momentos com leveza e qualidade. Tudo é cíclico e por isso, cultivar boas vibrações, elevando a frequência para que todos tenham momentos de paz e tranquilidade.


10. Visão Positiva do TEA: Seu livro incentiva uma visão mais positiva do autismo, apesar dos desafios. Como você sugere que os pais mantenham essa perspectiva positiva ao longo do tempo? Há alguma história inspiradora que você possa compartilhar para ilustrar isso?


Eu acredito que estamos aqui para evoluir e sermos melhores. Muitos traumas de adultos são originados na infância. Poder contribuir de uma maneira para que isso não aconteça nos torna um ser humano melhor. Coloco isso no livro através da minha trajetória. Não foi fácil para mim em nenhum momento, passei por muitas dúvidas, não sabia como agir. Mas tive consciência que me vitimizar não seria a solução. Todas as pessoas passam por dificuldades, cada uma em um grau. Então, fui em busca de como fazer para ter uma vida mais leve e extrair o meu melhor e o da minha filha. Não podia deixar que o TEA transformasse a nossa vida em um transtorno.

Acho imprescindível ter o olhar humanizado frente às diferenças e enaltecer cada passo, celebrar cada conquista dos nossos filhos e ter em mente que eles são muito especiais. Agindo assim, vamos construir um futuro com pessoas dignas, com segurança de serem quem são, valorizando-as fazer diferente para obterem resultados diferentes. Se isso for transmitido com amor para elas, o caminho de todos será leve e feliz.

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